sexta-feira, junho 16, 2006

ENTRE FASES.COM OU SEM



DUBLÊ DE CORPO/DUBLÊ DE OUTROS

Dublê de fogo
cruzado
o mesmo corpo
atirado pra todo lado
com muita gente junto
dentro
cada hora a vez
de um
do outro
artista ator
mentor
arranjador
arranjar a dor
e fingir
suas partes
falsas
falas
fazendo-se
fodendo-se
todas
caras
e bocas
- das bocas pra fora -
agora
tolas
máscaras
enfeites
arremates
cada fala, jeito, coisa
que não cola mais
dentro
de cada um cada todos
cada outro
num cadafalso
armadilha
ilha
desumana
de se habitar
o pior
é sempre o rosto
do outro
mais
alarme
alarde
falso.

Julio Carvalho

quarta-feira, junho 07, 2006

ENTERRADO E SUPLANTADO


Em covas vivas


Escuro e mãos frias
Lua quase cheia e pés quentes
O que me consome agora é estranho

Entranha no que penso

Revolta o que sinto

Faz-me mais humano
Posto que me põe a ferver em reflexões
Que me atordoa e me aperta de sentir

Faz-me parecer mais inútil
Posto que a distância dilata minha impotência
Que a saudade me paralisa num lembrar

Se sou mais Homem
Se estou menos funcional
Hei de não deixar de esperar
Uma vez ou duas ou mais

Uma vez que a falta de expectativa
Enterra minha ativa vida
Numa cova passiva de morrer
Antes do enterro deste vivo ser.


Às 5h, em setembro,
CilvaH.

OUTRA PESSOA


A TERCEIRA PESSOA DO SINGULAR

Ele é legal
Ele é irresponsável
Ele é quase saudável
Ele é poeta
Ele é sensível
Ele é irascível
Ele é maluco
Ele sabe de tudo
Ele é preguiçoso
Ele é agitado
Ele é nervoso
Ele está cansado
Ele é boa gente
Ele é o que falam
Ele é o que pensam
Ele é ele mesmo
Ele é diferente
Ele sabe pouco
mas sente tudo
sempre
Ele é um adulto
que muitas coisas
de criança
ainda
não aprendeu
mas mesmo assim
ele é bom

Ele sou eu.
Julio Carvalho

sábado, junho 03, 2006

SEM DOCUMENTO

Sem disposição pra nada que se faz consigo. Sozinho, então, escrevo com muita inspiração e pouco talento, parcas idéias...


INOMINADO

Ligo,
chamo,
não respondo
Engulo,
inspiro,
tento, mas não esqueço
Cheiro,
recordo,
recorto, fito longe...
Aqueço,
fricciono,
emputeço e me apaixono

Quanta oscilação!
Emoções instáveis
O amor linear, progressivo não sustenta o balanço dos impulsos
A equação de afãs, faltas ou desejos.

Será desatenção?
Quão subuumano é aprender a conviver com a dor
Seja qual for, meus dentes, minha garganta, minha cabeça...
Minha alma não suporta

Despaixão?
Esse anverso nem teima em se aproximar
Um pouco de paz faz bem
Um tanto de beijo pra quem tem

Isso mesmo!
Sinto falta de
Salivo por
Fecho os olhos para
Prendo o fôlego
Que nem tu
Nem tu pra mim
Nem eu pra ninguém
Tal beijo sem cheiro
Tal língua mordida
Até onde...
Até quando... resistir.

CilvaH

DA CRIAÇÃO.


POEMA PRÉ ARTE

Ai da arte
Se não for
Se não fizer
Se não ousar...

Ai da arte
Se não puder
Se não se mostrar
Se não alcançar
quem não puder ver...

Ai da arte
Se não puder ser
Se não aparecer
Se esmorecer...

Ai da arte
Se sumir
Se denegrir
vir ao chão
e sucumbir...

Ai da arte
que sobrevive
aos trancos
- mais barrancos
arrancando das almas criativas
ilusões de realidades
materializadas na pele
dos corpos sensíveis
amarrados à escravidão
da mesma arte
e a todo tipo
de prazer...

A arte é sempre algo a ser feito
esperando
acontecer.
Julio Carvalho

sexta-feira, junho 02, 2006

DE UM MINUTO PRA OUTRO



A idéia surgiu faz tempo, o texto também. Da idéia para o texto, horas se passaram, mas motivado pelo que sinto e tu sabes o quanto sinto, materializar este pequeno ensaio em papel e caneta não demorou mais do que um minuto:

De minuto

Um tempo pra ti
Meu tempo todo aqui
Desde um outro minuto
Quando um pensar devoluto
Se fez só teu.

Queria mais do que Lógica. Amei
Agora que amo, desejo razão, ciso
Para manter-me vivo
Segundos, durante o tempo distante
Preservar o bem amado, o bem amante.

Neste minuto, que me pertence?
Teus sonhos, teus gritos, teu consciente?
Tu, ainda que plasma, em cores tênues
Sempre conto contigo num penar de minuto
E me recolho sozinho num sorrir diminuto.


CilvaH,

Num dia de inverno de setembro de 2005, às 5h.

QUANDO TEMOS DOIS LARES É ASSIM

CHOQUE

Meu sangue redistribui seu pulso
Tudo aqui se aquece
Do suspiro ao curto sufoco
Lembro de coisas, fatos que não são reais
Eles se desdobram não muito além.

Neste vôo, porém, não há registro algum
Fecho os olhos e o que enxergo
É nada além da minha verdade
Estou no ar e não fomos pelos ares
Novas histórias, mesmo as oníricas,
Escrevem-se com os pés no chão.

Sigo meu velho rumo novo, de novo
Mas só alguns ficam pra trás
Outros estão impregnados
Até no sangue, que há pouco sentia forte
Choque nas pontas dos dedos
Latejando de dor, de saudades, de esperança

Agora, outros são irreais
Então, sigo sonhando com nossas coisas
Nossos fatos sempre presentes e tão legítimos.

Por CilvaH.

quinta-feira, junho 01, 2006

OS ACUSADOS.



PROPRIEDADE

Um outro,
outro,
e mais um outro...
Quantos são criados
e acusados dentro da gente
da culpa que se cria
cada um tem sua cria
seu filho manso
que não fala
mas apronta.
A culpa é um sintoma agudo
quando a gente
comete
qualquer
afronta.
É o seu próprio dedo
que o tempo todo
aponta...

Julio Carvalho

A PROSA DE UMA NOITE ESQUECÍVEL.



ANTIBIÓTICO

Cresce uma célula de razão, cheia de ponderação, reflexão, desilusão, orientação e tudo mais que desrime com Coração. É apenas uma célula equivalente a uma bactéria, a um micróbio, micro agente patogênico. Por enquanto. Sou vítima, sou paciente, não tenho anticorpos, me resta o meu corpo que ora pairou leve, mas que agora se preencheu de substâncias densas: mercúrio dos Gêmeos, azougue dos alquimistas. E o querer? Quero sim sobreviver. Se não te empenhares sobre nossas vidas, o querer é não poder e o não poder é minha vida comum morta.

(Me invisto de toda covardia p’ra empunhar tua caneta e te falar)

É fato que não é difícil lidar com células do tipo. Não quando o inquieto paciente se conscientiza desde logo, o logos. Talvez nem tanto antibiótico necessário. E o querer? Quero via oral, visual, auditiva. Quero uso tópico e o tópico é todo este eu pronto e doente de tanto pensar e de pouco amar-agir. Vem com a dose certa que será que sara? Claro que sara. A química se aperfeiçoa e todas as combinações podem reagir bem, quais sejam os sais de nossas carnes, alcalinos nossos líquidos ou ferruginosos nossos cortes. Nem tanto antibiótico p’ra desinfetar minhas idéias e meus impulsos, p’ra sanear este complexo e torná-lo etéreo ‘que nem’ o eterno.

Mas se te falta o que minha sobrevivência suspira, não me venhas com morfina. Meu bem-querer é no limite do meu bem-estar. Sem artificialismos. Se a carne é viva, se o nervo treme, se o músculo contrai, há plástica e há desejo e há paixão. Ao passo que p’ra amar, só estando razoavelmente lúcido. O suficiente p’ra considerar homicídio caritivo, branco, misericordioso... Deixa de drogas como estas. Como as da receita da noite de hoje, sem funcionalidade, sem originalidade. Sai e apaga a luz, pois se continuar assim, eu só isto que te peço. Ninguém, nada, nenhuma culpa ou responsabilidade.

Depois de morto, ainda terei uma vida inteira e longa adiante. Ora profunda. Ora leve. Ora alegre. Ora viva de novo p’ra outro(s).


CilvaH.